Eu queria que a vida fosse dividida em quatro estágios, mas que não acabasse nunca...
A infância é como a primavera.
É pura novidade e um calor que não sufoca nem faz pensar bobagens.
Tem uma inocência quase cafona, uma singeleza clássica, e traz no íntimo a certeza de que pela frente vem coisa boa.
A gente quer que passe logo, mas sabe que nunca mais será tão protegido, a mordomia não será eterna.
É quando as coisas acontecem pela primeira vez, é quando num arbusto verde vemos surgir alguns vermelhos, é surpresa, a primeira de uma série.
A adolescência é como o verão.
Quente, petulante, libidinosa.
Parece que não vai haver tempo para fazer tudo o que se quer e o que se teme.
É musical e fotogênica.
Dúvidas, dúvidas, dúvidas em frente ao mar. Mergulha-se no profundo e no raso.
Pouca roupa, pouca bagagem.
Curiosidade.
Vontade que dure para sempre, certeza de que passa.
Noção do corpo.
Festas e religião.
Amor e fé.
A maturidade é como o outono.
Um longo e instável outono, que alterna dias quentes e frios, que nos emociona e nos gripa.
Há mais beleza e o ar é mais seco, porém é quando se colhem os melhores abraços.
Ficar sozinho passa a não ser tão aterrorizante.
Fugimos para a praia, fugimos para a serra, as idéias aprendem a se movimentar, a fazer a mala rápido, a trocar de rota se o desejo se impuser, e não é preciso consultar o pai e a mãe antes de errar.
É o outono que tentamos conservar.
O inverno é como a velhice.
Tem sua beleza igualmente, exige lã, bolsa de água quente, termômetro e uma janela bem vedada.
O que não queremos que entre? Maus presságios.
O inverno é frio como despedida de um grande amor, mas sabemos que tudo voltará a ser ameno.
Queremos que passe, temos medo que termine.
Ficar sozinho volta a ser aterrorizante.
O inverno é branco, é cinza, é prata. É grisalho.
E, de repente, também passa.
Eu queria que tudo fosse verdade, que a vida fosse assim dividida em quatro estágios que mais parecem estações do ano, mas que não acabasse, que depois do inverno viesse outra primavera, e outro verão, e outro outono, que nunca são iguais, mas sempre se repetem, sempre voltam, são tão certos quanto o sol e a lua, todo dia, toda noite.
Eu queria.
(Marta Medeiros)
(Marta Medeiros)
Um comentário:
Na margem do mundo
além dos meus olhos,
Belo,
Sei que o exílio será sempre
verdejante de esperança,
O rio,
Que não podemos atravessar
corre eternamente.
(Samuel Menashe)
Tenha um lindo final de semana cheio de amor e paz no coração
Abraços: Eduardo Poisl
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